O rito pode ser uma prática individual ou
coletiva e geralmente remete a um mito para justificá-lo.
“O rito é uma ação seguida
de conseqüências reais; é talvez uma espécie de linguagem...”
significados inerentes ao mundo cotidiano, é também o significado que o diferencia
do simples ‘ato de fazer’, pois o fazer cotidiano (costume) também possui função e
sentido específicos, por exemplo, o ato de vestir determinada roupa não é um ritual
se atende somente à necessidade de se vestir.
Uma
cerimônia religiosa é um conjunto de ritos que relembram um episódio mitológico
(rito comemorativo), e nela contém toda a gama de rituais elementares (ritos de
controle a saber: louvações, tabus, purificações, sacrifícios, entre outros) que o
compõe.
Os ritos podem sofrer mudanças através do tempo, seja por mudanças
radicais de prisma religioso (como no caso das revoluções religiosas), ou por lentos
e mesmo imperceptíveis processos que dependem de uma lenta transformação do
ethos e da visão de mundo de quem as pratica, mas essas mudanças não
descaracterizam o rito como tal, sendo sua ‘rigidez’ justamente o que permite o seu
estudo pelo observador treinado (etnólogo, antropólogo, sociólogo, etc).
A estrutura dos ritos obedece a uma
gama de valores intrínsecos e transversalizados na vida cotidiana, pois servem
como legitimadores da ordem estabelecida pelo Sagrado e conhecido através dos
mitos, autenticando até mesmo aspectos temporais relacionando o tempo mítico
com o tempo social.
Uma das funções principais do rito é manter as relações sociais através de
hierarquias e “papéis” bem definidos, além de estimular a comunicação e
sistematizar as funções a serem exercidas. O rito se estabelece como troca entre os
homens e os Orixás, que através, por exemplo, dos ritos de passagem (iniciação e
obrigações de um, três, sete anos, por exemplo), eleva o status social do iniciado,
acarretando em uma mudança de cargo e levando-o a ter novas e mais atribuições.
As reconfigurações dos mitos e ritos dentro da umbanda,
obedecem a um processo social intenso. Da África ao Brasil, mais do que uma
mudança de localidade, mudou-se também os sistemas sociais dos africanos. Estes
deixaram de se relacionar pelo contato social e passaram a fazê-lo (com o mundo
e o outro) através do estabelecimento de uma divisão social do trabalho
caracterizado pelo sistema escravagista que inexistia na África.
mais abrupta do que se pensa a princípio, pois os africanos estavam distantes de
configurar na África os sistemas de trabalho servil característico escravidão.
Após a diáspora, suas relações étnicas se perderam, bem como seus
sistemas sociais e no Brasil, além de terem de se adaptar ao sistema servil de
trabalho, ainda tiveram que restabelecer o intercâmbio com os negros provenientes
das mesmas regiões.
modernidade aparece e contribui ainda mais com este distanciamento.
Esta dicotomia se torna evidente quando analisamos comparativamente o
culto aos orixás entre os yorubás, em seus vilarejos, seus sacerdotes e o cotidiano
de suas atividades – caracterizadas pela transmissão de conhecimento conhecida
por tradição oral, na qual os mais velhos passam os conhecimentos de culto aos
mais novos – em relação à moderna umbanda, com seus cursos de iniciação,
faculdade de teologia umbandista, colégios teológicos de umbanda sagrada, que
ensinam dentre outras coisas, a como fazer um assentamento dos Orixás e cultuá-los
através de rituais, etc.
O processo de se fazer conhecer o corpo moral destes dois modelos de
instituições religiosas fica a cabo do corpo de sacerdotes (Babalorixás, Iyalorixás e
seus congregados), este grupo “tem a ver diretamente com a racionalização da
religião e deriva o princípio de sua legitimidade de uma teologia erigida em dogma,
cuja validade e perpetuação ele garante” .
É justamente na racionalização da Umbanda através das várias tentativas de
sistematizar sua doutrina e teologia, que o culto, compreendendo seus mitos,
símbolos e ritos, sofrem as maiores ressignificações.
Apesar das diversas correntes de pensamento umbandista que surgiram
desde sua fundação oficial em 1908, alguns pontos em comum podem ser
apresentados:a) A umbanda é monoteísta;
b) Oxalá é o orixá supremo abaixo de Deus (muitas vezes sendo sincretizado com Jesus Cristo);
c) As principais entidades guias são os pretos-velhos, caboclos e crianças (erês), podendo existir mais
correntes espirituais como os povos baianos e ciganos, por exemplo, mas isso vai
depender de terreiro para terreiro;d) o uso da cor branca por parte do corpo mediúnico representando paz, pureza e harmonia, qualidades atribuídas a Oxalá;
e)as defumações no início dos trabalhos mediúnicos para a limpeza espiritual dos consulentes e médiuns;
f) o uso de cânticos (pontos cantados) entoados pela assistência para chamar os guias e homenagear os orixás;
g) a gratuidade dos trabalhos de atendimento ao público com consultas aos guias; e
h) a umband trabalha com 7 linhas comandadas por sete orixás principais.
Acreditar que existe uma só umbanda é o mesmo que acreditar que
existe uma só igreja evangélica e classificá-las de acordo com um dos vários
modelos específicos e depois generalizar para o todo.
Estas linhas de pensamento se referem às tentativas de sistematizar uma
doutrina única de umbanda que abarcasse todas as modalidades sob uma mesma
égide.
É importante enfatizarmos que anteriormente a época de Zélio, o nome
umbanda não existia oficialmente e muito menos era difundido, existiam as assim
chamadas macumbas em que já se manifestavam as entidades que seriam
posteriormente agregadas ao complexo panteão umbandista.
Nas demais linhas de pensamento a partir de Zélio encontramos:
A Umbanda Tradicional, fundada pelo caboclo das Sete Encruzilhadas na faculdade mediúnica de Zélio Fernandino de Morais (já descrita anteriormente) e que não trabalhava com Exu, aliás, desde a fundação da primeira tenda umbandista “Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade” pelo Caboclo até os dias de hoje não se fazem giras de Exu; mas outras tendas fundadas pelo Caboclo já apresentavam as giras de Exu desde o início, como, por exemplo, a Tenda São Jorge (REVISTA ESPIRITUAL DE UMBANDA, 2005, nº 4, pág. 22-23). Outra característica interessante e que reforça a informação sobre Exu é que só há sacrifício na “Tenda Nossa Senhora da Piedade” para Ogum. A Umbanda Branca ou Kardecista com um cunho espírita muito acentuado. São terreiros que apresentam uma tendência mais espírita em seus rituais, dispensando muitas práticas tradicionais, como o uso dos tambores e das danças, preferindo o silêncio, a oração e a realização de sessões de mesa branca. Nesse tipo de Umbanda não encontramos o cultro aos orixás, nem o trabalho dos exus e pombagiras, ou a utilização de elementos como atabaques, fumo, imagens e bebidas. Geralmente nessas umbandas, fazem o uso do Evangelho Segundo o Espiritismo de Kardec, além de trabalhar somente com caboclos, pretos-velhos entre outros mentores espirituais “espíritas”. A Umbanda do Caboclo Mirim (Escola de Mirim) cuja história marca uma tentativa de estabelecer mudanças doutrinárias e ritualísticas na condução dos trabalhos de umbanda. Como na história de Zélio e do Caboclo das Sete Encruzilhadas, a manifestação do Caboclo Mirim que deu origem a seu trabalho doutrinário também nasceu dentro de um Centro Espírita, no caso com uma verdadeira tradição espírita, visto que o médium do Caboclo Mirim, Benjamim Gonçalves Figueiredo, fazia parte de uma conhecida família de grande importância dentro do espiritismo.
As características do trabalho doutrinário do Caboclo Mirim diziam respeito à desafricanização dos trabalhos de umbanda (no uso da linguagem, uso do sacrifício ritual com animais, recolhimentos, obrigações, camarinha), o enxugamento ritual e da quantidade de apetrechos (roupas, indumentárias específicas das entidades, o uso exagerado de guias no pescoço, o excesso de imagens no altar, etc), a necessidade de constante estudo doutrinário (baseados em grande parte em duas fontes de informação: a doutrina espírita e a Teosofia), a não realização de trabalhos específicos somente de Exu., etc. Esta umbanda tem hoje o Primado de Umbanda no Rio de Janeiro com um grande centro de divulgação da doutrina do Caboclo Mirim, além de ser considerada por muitos como precursora da Umbanda Esotérica. A Umbanda Esotérica fundada por W. W. da Matta e Silva (1917-1988). Chamada por eles de Aumbhanda. É a mais universalista das umbandas existentes pois resgata fundamentos da cultura de todas as etnias do globo. A Umbanda Esotérica desenvolve a tese de que todo conhecimento que rege o ritual e as práticas, além das formas como os guias espirituais de umbanda se manifestam, correspondiam a uma linguagem simbólica, oculta, mas passível de ser conhecida e estudada. Havia então um aspecto exotérico e um esotérico na umbanda e o modo de revelá-la era através do conhecimento das principais tradições religiosas do mundo, entre elas a cabala, os vedas, etc. Esta escola fundamentou o trabalho da umbanda também através de outras tradições místicas e esotéricas como a Teosofia, a Astrologia, e em um instrumento místico-esotérico chamado Arqueômetro, com o qual seria possível se chegar ao significado oculto dos símbolos astrológicos, das combinações numerológicas, suas relações com a cabala, relacionando-o também com o uso de determinadas cores.
Esta umbanda não faz sacrifícios animais e também rejeita outras aproximações ritualísticas entre a umbanda e as tradições religiosas africanas. Para a Umbanda Esotérica, as sete linhas de umbanda são compostas por: Oxalá, Ogum, Oxossi, Xangô, Yemanjá, Yori e Yorimá. Yori e Yorimá, desconhecidos na África, seriam as correntes espirituais que representariam a corrente das crianças (Yori) como espíritos evoluídos que se esconderiam nas manifestações de crianças para passar seus ensinamentos; e a corrente dos pretos-velhos, também chamados de pai-velhos (Yorimá) como mestres ascencionados com missão de esclarecimento e luz para toda a humanidade.
Esta escola encontra grande espaço nos meios umbandistas atuais e conta hoje com uma derivação conhecida pelo nome de Umbanda Iniciática, que tem como maior expoente atual Rivas Neto (Mestre Arhapiaga), fundador e atual diretor geral da FTU – Faculdade de Teologia Umbandista. Ambas têm grande influência orientalista. Esta última faz grande uso de mântras e da utilização ritual e iniciática com o sânscrito. A Umbanda Mística, derivada da Umbanda Tradicional de Zélio e o Caboclo das Sete Encruzilhadas, mas com grande influência do catolicismo popular e suas tradições. A Umbanda Mística talvez seja a expressão umbandista mais difundida pelas cidades de interior do Brasil a fora e também nas periferias das grandes cidades.
Na Umbanda Mística há rituais de culto as formas com ritos e fundamentos que se focalizam nas formas místicas de apresentação das entidades (índio, pretovelho, criança) com adição de novas formas de folclore regional: baianos, malandros cariocas, mineiros, boiadeiros, jangadeiros, marinheiros, ciganos, exus e pombagiras. A Umbanda Mística não possui uma doutrina específica que a diferencie de outros ramos da umbanda, estas diferenças vão se manifestar principalmente na forma de executar os trabalhos pois seus cultos se baseiam na utilização de muitos sacramentos da Igreja Católica. A Umbanda Sagrada desenvolvida por Rubens Saraceni, baseia-se nos ensinamentos psicografados por ele através de entidades espirituais, como por exemplo, o preto-velho Pai Benedito de Aruanda, entre outros. A Umbanda Sagrada visa uma completa separação das teorias africanistas, espíritas, católicas e esotéricas da umbanda, que segundo ele, tem uma teologia própria e muito bem estruturada. Sua Doutrina e Teologia se aproximam muito de concepções cientificistas para explicar a existência dos orixás, dos guias espirituais e das forças da natureza, mas acaba se aproximando um pouco da tendência universalista da Umbanda. O Omolokô, trazida para o Brasil por Tancredo da Silva Pinto. Omoloko é uma palavra yorubá, que significa: Omo - “filho” e Oko – “fazenda”, zona rural onde esse culto, devido à intensa repressão policial que havia naquela época, era realizado. No Omolocô tanto se manifestam entidades características da umbanda, como se manisfestam os inkices (considerados a grosso modo como um correspondente bantu para orixá).Mas além do Omolocô, ainda podemos apontar uma tendência umbandista que tenta se aproximar das tradições africanas. A chamada Umbanda Traçada, vulgarmente conhecida como Umbandomblé, se caracteriza por praticar os rituais do candomblé, fazendo também as giras de umbanda com todas as entidades deste panteão, inclusive Exu.
Outras formas existem, mas não têm uma denominação apropriada. Se
diferenciam das outras formas de Umbanda por diversos aspectos peculiares, mas
como cada terreiro segue na maioria das vezes mais de uma tendência de
pensamento, fica impossibilita da sua classificação satisfatória.A nova Era, o Terceiro Milênio,
permite ao homem, no sentido lato, o relativo conforto de
que saber e fazer nem sempre têm de ser seguido ou antecipado por uma
verbalização que a explique. Dessa forma o sentir passa a ser valorizado,
retomando a importância das expressões religiosas.Os umbandistas do Terceiro Milênio buscam uma tentativa de estabelecer uma doutrina
única para a Umbanda, ou seja, uma sistematização teológica, de institucionalização da religião.Porém, enquanto isso não acontece e a Umbanda ainda segue de maneira menos sistemática e mais pragmática, um dos principais
legitimadores da Umbanda é o seu filho de fé e, o seu ritual, deve ser baseado na coerência e bom senso, onde a agressão não seja compactuada em nunhum aspecto. Se a Umbanda é "Luz Divina", que o Divino esteja presente em todo seu reflexo.Nota: a fonte de pesquisa dessa postagem foram textos da dissertação de LENNY FRANCIS CAMPOS DE ALVARENGA, no Curso de Mestrado em Ciências da Religião da Universidade Católica de Goiás, a quem agradecemos tantos esclarecimentos.
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